Psico-Socializando por Henrique Weber
Ainda estou aqui
É com grande satisfação que o filme “Ainda Estou Aqui” (2024), de Walter Salles, vence o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (Hollywood). Porque ele retrata uma história que foi o capítulo mais triste de nosso país. Os brasileiros e o mundo precisam conhecer. Eu terminei de ler o volume 2 de “As Ilusões Armadas – A Ditadura Escancarada” (Elio Gaspari, 507 páginas), e estou conhecendo mais sobre os governos militares de 1964 à 1985. Desde o golpe, a tortura foi usada como arma política. Nos primeiros dias, foi instrumento para evitar o contragolpe. E, nos restantes 21 anos, como instrumento de poder. A tortura era um horror, uma perversidade, uma doença social e institucional, sua existência era abjeta, imoral, e não havia apoio da sociedade (e não podia ser diferente). Não se podia criticar o governo militar, com o risco da pessoa se tornar suspeita de ter uma posição política à esquerda. Era taxada de comunista. Imaginem vocês, se nos dias de hoje nós não pudéssemos criticar o atual governo.
Como aconteceu naquele tempo? Se você criticasse o governo militar, e marcasse com uma atividade de oposição, qualquer militar poderia denunciar você, e abrir assim uma IPM (Inquérito Policial- Militar). Você poderia ser conduzido a uma delegacia (DOI-CODI) e ser investigado através do depoimento (a tortura passou a ser prática indispensável caso houvesse alguma ligação com a oposição). Muita gente morreu nessa “investigação” (que era um grande delírio-paranoico) e toda a sociedade teve conhecimento dela, se mobilizou para se autodefender, todos tinham medo da violência de Estado. O alto comando do governo militar, nas figuras de Castello Branco, Costa e Silva, Medici, Geisel e Figueiredo, “passavam pano” para esta anarquia militar.
Aí que aparece a figura de Rubens Paiva (papel de Selton Melo). Ele era deputado federal pelo PTB, partido do Presidente deposto, João Goulart, em 1964. Teve seus direitos cassados pelos Atos Institucionais que fecharam o Congresso. Foi através de uma interceptação de uma carta pela Censura (CIE – Centro de Informações do Exército) vinda do Chile, que se suspeitou que o remetente (sempre anônimo, é claro) fosse de um militante revolucionário cujo conteúdo citava o tal deputado. Paiva foi levado para uma acareação em janeiro de 1971. Foi torturado decerto com os métodos usuais de espancamento e eletrochoques (pau-de-arara). Fim da tortura, Paiva precisava de cuidados médicos, mas ir para um hospital era tirá-lo dos porões da ditadura para ser foco de notícias, afinal ele era um deputado. Mais uma vez, a falta de pulso do governo militar em se tomar uma decisão fez com que demorasse a ajuda ao deputado, vindo ele a falecer. Inventaram umas três versões para o ocorrido. E o governo decidiu sumir com o seu corpo. Nunca mais foi encontrado.
Eis que surge Eunice Paiva (papel de Fernanda Torres), esposa do deputado, que bateu de porta em porta por uma resposta, do Supremo Tribunal Militar ao Conselho de Defesa dos Direitos Humanos. Ela foi corajosa, pois quem ousasse enfrentar o Regime ora acabaria sendo alvo de inquérito.
Devo confessar a vocês que não assisti o filme, ainda. Porém, todo este sucesso me enche de alegria por um motivo: os brasileiros precisam conhecer a história de nosso país, o regime totalitário dos governos militares (anti-democráticos). É uma das coisas mais tristes que já li, e eu não tenho palavras para descrevê-lo. Walter Salles surpreende, mais uma vez, com um filme de temática social, indispensável para a cultura do nosso povo. Foi assim com Terra Estrangeira (1995), Central do Brasil (1998), Abril Despedaçado (2001), Cidade de Deus (2002), Linha de Passe (2008), todos estes filmes eu assisti e são todos maravilhosos. Parabéns pela sua arte, sua direção, e que possa fazer refletir o nosso povo. Viva o Cinema Brasileiro!
Marque sua consulta psicológica em www.henriqueweber.com ou pelo Whatzap 51 99265-4020.